Odilo Balta / jornalcorreiodosul@terra.com.br
Fonte: BBC News
Cerca de oito anos atrás, um importante produtor de papel na Finlândia percebeu que o mundo estava mudando.
O crescimento das mídias digitais, a queda do uso de papel nos escritórios e a redução da popularidade do envio de objetos e papéis pelo correio, entre outros fatores, significava que o consumo de papel passou a enfrentar um declínio constante.
A empresa finlandesa Stora Enso define a si própria como "um dos maiores proprietários de florestas particulares do mundo". Ou seja, ela possui muitas árvores, que são usadas para fabricar produtos de madeira, papel e embalagens. E, agora, ela também quer produzir baterias de veículos elétricos que possam ser carregadas em até oito minutos.
A empresa contratou engenheiros para analisar a possibilidade de uso da lignina, que é um polímero encontrado nas árvores. A lignina compõe cerca de 30% das árvores, dependendo da espécie, enquanto o restante é basicamente celulose.
"A lignina é a cola das árvores, ela meio que cola as fibras de celulose entre si e também faz com que as árvores fiquem muito rígidas", explica Lauri Lehtonen, chefe da Lignode, a solução de baterias baseadas em lignina da Stora Enso.
A lignina é um polímero e contém carbono. E o carbono é um ótimo material para produzir um componente vital das baterias, chamado ânodo. A bateria de íons de lítio do seu telefone celular, com quase toda certeza, tem um ânodo de grafite. E o grafite é uma forma de carbono com estrutura estratificada.
Os engenheiros da Stora Enso descobriram que podem extrair lignina da polpa residual que já é produzida em algumas das suas fábricas e processar essa lignina para fabricar material de carbono para os ânodos das baterias.
A empresa já firmou parceria com a companhia sueca Northvolt e planeja começar a fabricar baterias já em 2025.
Com cada vez mais pessoas comprando carros elétricos e armazenando energia em casa, estima-se que a demanda global por baterias apresente forte crescimento nos próximos anos.
Para Lehtonen, "a demanda é simplesmente alucinante".
Em 2015, foi necessário gerar algumas centenas de gigawatts-hora (GWh) a mais para carregar baterias em todo o mundo. Mas esta demanda irá disparar até atingir milhares de GWh anuais em 2030, à medida que o mundo reduzir o consumo de combustíveis fósseis, segundo a empresa de consultoria empresarial McKinsey & Company.
A questão é que as baterias de íons de lítio que usamos hoje em dia dependem, em grande parte, da mineração e de processos industriais que prejudicam o meio ambiente.
E alguns dos materiais usados na fabricação dessas baterias são tóxicos e de difícil reciclagem. Muitos deles vêm de países com problemas em relação aos direitos humanos.
Para produzir grafite sintético, por exemplo, o carbono precisa ser aquecido por semanas a fio a mais de 3000 °C. A energia usada no aquecimento, muitas vezes, vem de usinas elétricas movidas a carvão na China, segundo a empresa de consultoria Wood Mackenzie.
Por isso, a busca por materiais sustentáveis para uso em baterias que sejam amplamente disponíveis está aberta. E algumas pessoas dizem que podemos encontrá-los nas árvores.
Geralmente, as baterias precisam incluir um cátodo e um ânodo - os eletrodos positivo e negativo, respectivamente - para que as partículas carregadas chamadas íons possam fluir entre eles.
Quando a bateria é carregada, os íons de lítio ou sódio, por exemplo, são transferidos do cátodo para o ânodo, onde ficam estacionados como carros em um edifício-garagem, como explica a consultora independente Jill Pestana, engenheira e cientista especializada em baterias da Califórnia, nos Estados Unidos.
"A principal propriedade desejável nessa estrutura de estacionamento de material é que ela possa receber facilmente o lítio ou o sódio e deixar que ele saia, sem desintegrar-se", explica ela.
Quando a bateria é descarregada para alimentar algo como um carro elétrico, os íons retornam para o cátodo depois de liberar os elétrons, que se movem através do fio de um circuito elétrico, transferindo energia, no caso, para o veículo.
Pestana afirma que o grafite é um material "espetacular". Seu funcionamento como ânodo é tão confiável que permite que essas reações aconteçam. Materiais alternativos, incluindo as estruturas de carbono derivadas de lignina, enfrentam dificuldade para demonstrar sua adequação para o trabalho.
Mas existem diversas empresas que estão explorando o potencial da lignina no desenvolvimento de baterias. Uma delas é a sueca Bright Day Graphene, que produz grafeno, que é outra forma de carbono, a partir da lignina.
Também Lehtonen exalta as virtudes do material de ânodo de carbono da sua empresa, a Stora Enso, que o batizou de Lignode. Ele não revela exatamente como a companhia transforma a lignina em uma estrutura de carbono rígida, nem o que é exatamente essa estrutura.
Ele informa apenas que o processo envolve o aquecimento da lignina, mas a temperaturas muito abaixo das necessárias para a produção de grafite sintético.
Uma característica importante da estrutura de carbono resultante é que ela é "amorfa", ou irregular, segundo Lehtonen. "Realmente, ela permite muito mais mobilidade de entrada e saída dos íons", afirma ele.
A Stora Enso afirma que isso os ajudará a fabricar baterias de íons de lítio ou de sódio que podem ser carregadas em até oito minutos. O carregamento rápido é um objetivo importante dos desenvolvedores de baterias para veículos elétricos.
Fonte: BBC News